terça-feira, 5 de maio de 2015

A insustentável contradição do "professor"

Em resposta a Ramalho - sociólogo da UFS e seu interessante artigo Professores ou vampiros?

Em momento algum José Rodorval Ramalho se intitula ou se autoafirma como professor, exceto um asterisco que remete ao fato de considerá-lo sociólogo e professor da UFS ao final de seu artigo.

De acordo com o currículo Lattes dele, atualizado há quase 3 anos (sic!), na instituição na qual ele chegou mestre e está há quase 20 anos em regime de dedicação exclusiva, supostamente há mais de 10 anos no Colegiado de Ciências Sociais, tendo uma vasta publicação no jornal mais popular (sic!) sergipano, ele é, pasmem, professor!

Exatos 10 anos após a chegada de Ramalho à UFS, assumi função no posteriormente cindido Departamento de Letras (DLE) da UFS, que acabara de voltar de uma longa greve - ponto fulcral no artigo de opinião dele em relação aos "professores brasileiros" que, segundo ele, se deixam "vampirizar" por uma "horda de sanguessugas" - os "sindicalistas" que usam-nos como "bucha de canhão" e se refere mais especificamente aos episódios vividos em território peessedebista paulista ("apoiado apenas por uma pequena parcela da categoria") e paranaense, onde, na visão deturpada dele, os protagonistas envolvidos naquele episódio, "ELES queriam um cadáver, um mártir" e que a polícia, "felizmente, agindo dentro da lei, defendeu o parlamento...", pois esses "professores" seriam uma "turba de delinquentes".

Afinal, esse professor que escreveu isso não é professor? Ou ele só é professor para receber seu salário? Ele não se envergonha de tratar a "categoria" com tamanho desprezo e descontexto sócio-histórico-crítico? Por acaso, quando assumi em 2006, não estava ele em greve na UFS? Ou as greves da UFS são mais legítimas do que as dos professores estaduais ou municipais?

É desprezível a visão de um professor doutor que, embora não seja o caso, em início de carreira receba R$ 8.800,00 (em detrimento do piso da educação básica de 2015 em R$ 1.917,78), envolva-se em greve e fale tão aparentemente sem conhecimento de causa de outro professor que seja sindicalista ou ativista sindical. Isso beira à anti-ética profissional.

E por falar em sindicalistas, passado primeiro contrato na UFS, a partir de 2006, em 2013, ao voltar dos Estados Unidos, assumi função no Colégio de Aplicação, também da UFS, e, coincidência ou não, é de lá os dois sindicalistas representantes máximos seja de docente, seja dos técnicos. Um deles inclusive foi proprietário e morador onde resido e possui uma conduta ilibada. O outro, idem; ambos geógrafos. Francamente, não sei que tipo de destemperamento faz um professor universitário escrever tanta bobagem generalizada sobre outros cuja categoria ele deveria solidarizar-se e apoiar. Isso é o mínimo que se espera de um ser humano.

O senhor Ramalho afirma que "o maior PRIVILÉGIO é o amplo direito de fazer greves sem desconto de salários" e se pergunta até quando legisladores permitirão que isso seja possível. Estaria o dotô sugerindo o cerceamento do direito de protestar? Até porque, embora outros grupos sociais façam greve, o professor é o único a ter de repor dias não trabalhados.

Por acaso, gostaria o professor de ter de trabalhar dobrado por ter sido licenciado para fazer seu doutorado em São Paulo sob os auspícios do governo federal? Então: quando gente assim devolver o que recebeu, talvez consiga o mínimo de comoção em gente como eu, que trabalha semanalmente 24 horas, que traz material para corrigir em casa, que planeja suas aulas e não as pauta em besteirol ou faz da sala de aula uma apologia ao anti-petismo ou qualquer outro partido, logo, uma explícita estratégia de incitação ao ódio, ao invés de desvencilhar o que está por detrás do que é dito.

O título da minha postagem é uma quebra total de expectativa de horizonte da obra de Milan Kundera de 1984, época que marca a metade da graduação de Ramalho. Ele não viveu a Primavera de Praga de 1968, tampouco a Árabe de 2011 ou nosso atual outono, ao que tudo indica... Embora Kundera admita que a existência humana carregue ao mesmo tempo leveza e peso, o professor só enxerga este em detrimento daquele. Parece-me que ele deva amar mais e deixar a política um pouco mais de lado ou dosar as duas coisas a fim de tornar-se mais produtivo e refletir um pouco mais antes de escrever suas ideias.

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