O respeito de uma sociedade ignorante vem a socos e
pontapés, como na época da ditadura, em que, numa sala de aula, se podia
colocar um aluno de castigo. A educação de qualidade para nossos brasileiros
virá com a canalização dos recursos para os seus devidos fins e isso inclui
escolas modernas, que não pareçam sistemas prisionais, profissionais bem
remunerados e gestores que entendam que o quintal de suas casas não tem nada a
ver com essa escola do século XXI.
Uma breve resposta para Rania Rego de http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/professores-acordem/
Quem gosta do modelo cubano é porque ele é o único da
América Latina e Caribe que deu certo, porém nós não deixamos de entender que
vivemos em democracia e o povo cubano, em ditadura. E nós sabemos que não
queremos uma ditadura, logo, embora almejemos os resultados de Cuba, queremos
construir nosso próprio modelo.
A educação brasileira [pública] só vai avançar quando os
grupos sociais oriundos dos meios mais abastados estiverem a usufruir dela. Até
porque sabemos que mesmo a educação brasileira ofertada nas escolas privadas sequer
chega a patamares consideráveis comparáveis a de países desenvolvidos, cujos índices articulistas costumam mencionar em suas matérias.
Em Cuba e outros [poucos] nichos "comunistas" ao
redor do globo, não existe um hospital para quem tem menos dinheiro ou uma
escola para quem tem mais dinheiro; mesmo assim, há elites fortes que controlam
e sufocam o povo e cerceiam direitos mínimos. Lá também não se oferece ensino
regular noturno ou se matriculam 60 alunos numa sala de aula com pouca ou
nenhuma ventilação. Lá há dois professores (por sala), materiais essenciais
para as aulas, controle, disciplina e laboratórios.
Ainda sobre Cuba, em média, o vencimento é muito menos da
metade do que a matéria “Professores, acordem!” informa, não sei se é porque a autora da matéria sensacionalista nunca foi à ilha ou porque sua formação em jornalismo a faz reduzir o mundo
a números, que não correspondem à realidade. O gigante vizinho também não
oferece ensino regular noturno e dispõe de tecnologias de ponta para atender a
uma necessidade da atualidade - as mídias. Mas paga, em média, U$D 3,300.00 a um professor da educação básica, que certamente não tem 2 ou 3 empregos.
Nossa educação é pensada verticalmente e recebemos pacotes
para aplicá-los. Quem nos representa quer resultados, mas não adéqua a
infraestrutura. Quem pensa por nós não conseguiria ficar uma manhã inteira nas
salas de aula onde trabalhamos e faz suas mirabolantes pesquisas a partir de gabinetes com ar-condicionado, boa internet e bolsas de pesquisa isentas de imposto de renda, além de receber salários que são 3 vezes, em média, mais pomposos que o do professor médio brasileiro.
Acreditamos que você use o termo "discurso" de
maneira vaga e genérica, tão vaga e genérica quanto seus argumentos falaciosos
para convencer uma elite que compra a revista para a qual escreve e forme uma
opinião errônea acerca do professor "médio" brasileiro. A senhora mistura coisas imisturáveis e chega a receitas que beiram o ridículo.
Quando, num contrato de 20 horas, leciono 08 tempos de 50
minutos com no máximo 30 alunos em sala e recebo quase a mesma coisa por 24
tempos lecionados e 60 alunos em cada uma dessas salas, a senhora há de convir
que essa matemática obedeça a números multiplicativos e que há uma drástica diferença
entre professores médios. Afinal, de quem a senhora está falando? Porque sua
fala não representa o professor médio brasileiro.
A senhora Rego não
cita em suas matérias que nossos gestores foram colocados por nossos
governantes, que foram eleitos, muitas vezes, através da manipulação de uma
generosa parcela da população que vai às urnas para escolher, mas a educação ofertada
não contribui muito para formar uma opinião e que as elites, que compram sua
revista, já têm seus candidatos e só podem ser aqueles que representem seus
interesses.
Essa mesma elite acha um absurdo que o filho da empregada,
cujo salário mínimo acha outro absurdo ter de pagar, curse, por exemplo, Medicina com
seu filho, pois este curso, e mais meia dúzia deles, é naturalmente deles. Em
Cuba, não se pode escolher governante, mas qualquer um pode ser médico.
Esse discurso de vitimização
de nossas lideranças ao qual vagamente a articulista se refere nada mais é que
atender a interesses de políticos em prol de alianças para conseguir um espaço
na corrupta política brasileira, à qual a senhora nunca faz menção alguma.
Por que será que os mesmos professores que estão na escola
privada são aqueles selecionados para as escolas públicas? Quem é coitadinho,
estropiado e maltratado e quem é competente e comprometido nesse jogo de
palavras? Por acaso, o professor que leciona nas duas redes deixa de ser a
mesma pessoa?
Por que a senhora não se refere à greve dos bancários ou à dos
médicos, que não precisam repor dia algum de trabalho? Fazemos greve porque
sabemos que vivemos em democracia, é um aparato legal e é papel do Governo
encontrar quem nos substitua para os dias não trabalhados, afinal greve e
férias são coisas bem díspares. E até nas férias as leis acobertam o
funcionário público gozá-las e receber com 1/3.
Sendo uma jornalista, muito nos admira que não reconheça que
as coisas estão em constante mudança e que o que se comprava com um real logo
após a URV de 1996 sequer dá para comprar hoje. A senhora faz de conta que
desconhece que os recursos que vêm para nós não são destinados corretamente,
pois nossos gestores não têm formação suficiente para entender uma escola como
uma empresa, mas a extensão de suas casas.
Assim, a senhora desconhece que piso não é teto e mistura as
coisas, não cita, por exemplo, que, em Sergipe, não se pagou o percentual de reajuste de
2012 de uma lei federal e o mesmo está acontecendo em 2015... Ainda, naturaliza
o inaturalizável, prestando um
desserviço à população brasileira que lê suas porcarias com fome de crítica a
um governo que nos últimos 12 anos tem ampliado o acesso à educação.
Gananciosos nós professores? A senhora sabe quantos de nós
têm uma jornada de 24 horas (1 vínculo), 48 (2 vínculos) e até mesmo um
terceiro vínculo numa instituição privada? Ambição desenfreada de ficar rico,
de obter lucros, legal ou ilegalmente? A senhora só pode estar de chacota com o
mais néscio dos seus leitores...
É preciso ser um cretino intelectual para imaginar que uma
pessoa ganhar mais faz outra aprender mais. O que esses estudiosos da área
deveriam saber é que vivemos no século XXI e que a sala de aula continua como a
do século XVIII no Brasil. Que diferença entrar numa sala de aula americana ou
cubana!!! Ou a senhora não sabe comparar?
A senhora sabe por que faltamos? Quais são nossas
necessidades? O que é dar 48 tempos numa semana? Claro que não!!! Se uma
disciplina tem 1 aula só por semana, se cada sala tem 60 alunos, o professor
precisa pegar 24 turmas, use a calculadora para perceber com quantos seres
humanos essa pessoa lida... Nós vivemos um sério problema curricular e de
gestão, mas não de má vontade ou falta de profissionalismo, afinal fomos
selecionados através de concurso público. Nós não devemos nossos salários a
empreiteiros, empresários ou favores políticos.
Quanto a suas "teses" finais: somos tratados como
anencéfalos e ao reagir pode acontecer o que houve no Paraná, cuja menção não
vemos em matérias como a sua - o que me faz refletir que a senhora é uma pessoa
desinformada e que escreve com outros propósitos.
A segunda tese está diluída ao longo de meu texto que a
"luta" não é só por salário, mas se um profissional trabalha 3 vezes mais com o
dobro de alunos e recebe a mesma coisa entre redes de ensino públicas
diferentes há algo muito nefasto em jogo.
Sua terceira tese é igualmente contraditória. Por exemplo,
que contribuição tem seu texto de jornalista a dar para a melhoria da educação
brasileira? Nenhuma. A senhora não nos brinda com absolutamente nada novo, ataca
por atacar, ignora processos sócio-históricos e interesses politiqueiros em
nosso país e sequer cita as razões pelas quais vários Estados estão em greve há
meses. Em um deles, inclusive, recentemente, o Governador se elegeu prometendo dobrar o salário dos
professores. Aqui em Sergipe isso não funcionou na transição do então Governador João Alves para Marcelo Déda. A senhora há de convir que uma Pátria Educadora se faça também com
educadores e não com gente mentirosa.
Em relação à quarta, apesar de já ter, por duas vezes,
mencionado a grande diferença entre salários em duas redes públicas, quando a senhora provar para onde onde está destinando seu salário, se é para instituições de
caridade ou o raio que a parta, talvez alguns de nós - os mais ingênuos - sigam
o mesmo exemplo e passem a ir ao trabalho a pé, comam apenas raízes e vistam
roupas feitas de material biodegradável. Porque foi só isso que a senhora faltou
mencionar nessa porcaria de texto.
O respeito de uma sociedade ignorante vem a socos e
pontapés, como na época da ditadura, em que, numa sala de aula, se podia
colocar um aluno de castigo. E nós não queremos essa época nefasta, que
assegura a qualidade nas escolas federais militares. A educação de qualidade
para nossos (sic! - eu não sabia que a senhora ou alguém que lê essa revista tem
filho em escola pública) brasileiros virá com a canalização dos recursos para
os seus devidos fins e isso inclui escolas modernas, que não pareçam sistemas
prisionais, profissionais bem remunerados e gestores que entendam que o quintal
de suas casas não tem nada a ver com essa escola do século XXI.
Um comentário:
Não digere bem a verdade quem é ridicularizado por ela.
Sou professor e concordo com tudo que Rania Rego narrou em seu revelador texto.
Irei me aposentar este ano, por idade, e sou testemunha que tudo que foi ponderado por ela é real.
E viver em um meio em que se elegeu a zona de conforto como ideal é muito desgastante.
Postar um comentário